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Despenalização da morte assistida aprovada no Parlamento

Despenalização da morte assistida aprovada no Parlamento

A deputada socialista Isabel Moreira salientou hoje que o projeto de lei do PS que regula as condições especiais para a prática de eutanásia não punível tem sempre presente o “respeito pela Constituição, porque está em causa despenalizar a eutanásia em condições especiais e não, evidentemente, liberalizar a eutanásia”. E deixou claro que são “de uma crueldade revoltante” os argumentos de alguns de que “não é preciso esta lei, porque as pessoas podem sempre suicidar-se”.

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Participação de cidadãos no Parlamento triplica

O projeto para a despenalização da morte assistida, apresentado pelo Partido Socialista, foi hoje aprovado na Assembleia da República, na votação na generalidade, assim como os quatro projetos sobre a mesma matéria apresentados por Bloco de Esquerda, PAN, PEV e Iniciativa Liberal.

“Ao longo do tempo, cada indivíduo é convocado a tomar inúmeras decisões vitais sobre a sua vida e que só aos próprios dizem respeito. É assim no Estado de direito”, começou por frisar Isabel Moreira, no Parlamento, durante o debate dos cinco diplomas.

A socialista lembrou que “cada pessoa é, desde que não prejudique terceiros, a arquiteta livre do seu destino” e, por isso, a “sua autonomia deve abranger algum tipo de decisão sobre uma dimensão essencial da vida – a sua morte”.

Perseguir penalmente quem ajuda um doente incurável é “afirmação de intolerância”

“Impor um dever de viver nas situações limite previstas neste projeto lei, em face da autonomia individual resultante da dignidade da pessoa humana, leva-nos a ter esta convicção profunda: perseguir penalmente quem ajuda um doente com uma doença incurável é uma afirmação de intolerância”, assegurou.

Isabel Moreira defendeu que este “debate faz sentido agora”, já que “é sempre hora para pôr fim a uma injustiça”. “É uma demissão continuar a fechar os olhos às histórias íntimas que guardamos ou de que temos notícia de quem conseguiu ajuda para morrer na clandestinidade, de quem foi ao estrangeiro qual foragido e de quem não conseguiu e teve de suportar conceções de dignidade alheias”, avisou.

A parlamentar do PS considerou essencial que a decisão do doente “seja efetivamente fruto de uma vontade atual, séria, livre e esclarecida”. E deixou um recado aos “tristes” que “trouxeram para um debate destes casos de demência, depressão ou de pessoas inconscientes”, uma vez que estes estão “obviamente excluídos do projeto, casos que serão sempre crime, agora e no futuro, por imposição constitucional”.

Isabel Moreira voltou a explicar que estão previstas quatro fases detalhadas, havendo uma quinta eventual, “e em todos os passos do procedimento clínico a reiteração da vontade do doente, sempre consciente, são registados, datados e assinados”.

E terminou com uma mensagem a todas as bancadas: “O voto de hoje, a favor deste projeto de lei, não esmaga as convicções de ninguém. O voto contrário só permite que sobrevivam as convicções de alguns”.

É insultuosa ideia de que quem está a favor da eutanásia é contra paliativos

Já o vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS Porfírio Silva frisou que “a vida humana não é só biologia e nem toda a técnica e toda a tecnologia, juntas, conseguem aliviar toda a dor”. E deixou uma questão: “Quem somos nós para julgar o sofrimento dos outros?”.

“Ninguém decide morrer porque sim. Ninguém decide morrer de ânimo leve. Toda a vida tem dignidade, mas eu não quero impor a outra pessoa a minha visão da dignidade, tal como não quero sofrer eu essa imposição”, asseverou o deputado.

Também o deputado do PS Alexandre Quintanilha elogiou a proposta do partido, que “demonstra coragem, porque tratando-se de um tema que desperta emoções fortes, vai ao encontro de uma necessidade reconhecida por muitos dos nossos cidadãos. Demonstra humildade no cuidado da sua redação ao delimitar de forma extremamente restritiva os casos em que se aplica e trata o outro com o respeito, a dignidade, a compaixão exigidos quando toma uma das decisões mais importantes da sua vida”.

Alexandre Quintanilha deixou depois um aviso: “A ideia de que os que são a favor da morte assistida são contra os cuidados paliativos é insultuosa”.

Despenalização da eutanásia respeita sempre vontade do doente

No encerramento do debate, a deputada do PS Maria Antónia de Almeida Santos vincou que o projeto do partido não tenta “instrumentalizar a vida, trata-se antes de legislar sobre em que condições um pedido de eutanásia não é punível, é atender ao pedido de abreviar a vida por decisão da própria pessoa doente, em situação de sofrimento extremo, com lesão definitiva ou doença fatal e incurável, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde, sem que estes sejam perseguidos e condenados”.

“Viver é um direito e proteger a vida é um dever do Estado, ninguém o contesta, mas não podemos ignorar as pessoas para quem o diagnóstico é irreversível e que estão em sofrimento extremo a sobreviver a uma vida sem sentido para o próprio”, apelou a também presidente da Comissão Parlamentar de Saúde.

O diploma do PS respeita sempre a “vontade do doente, livre, séria e esclarecida”. “Estamos conscientes da importância deste requisito, não admitimos que essa vontade seja diferida para momentos em que o doente já não disponha de plena consciência”, ressalvou.

Maria Antónia de Almeida Santos alertou depois para o ponto de vista dos profissionais de saúde: “Há médicos que ajudam, há médicos que querem ajudar, mas temem a penalização, porque não há quadro legal que os proteja, e há médicos que serão sempre objetores de consciência”.

Os doentes “vivem perante uma incógnita” e há uma “situação real de desigualdade entre os que podem pedir ajuda, indo ao estrangeiro, e os que não podem”, preveniu.

“Também por isto a despenalização da eutanásia em situações muito restritas e ponderadas é mais segura do que o quadro em que agora vivemos” em Portugal, concluiu a deputada do PS.