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Desafio para um duelo

Desafio para um duelo

Estamos longe dos tempos em que as questões de retidão se resolviam em duelo. Eram épocas em que a política e a honra se afirmavam sinónimos, em que o próprio, ou o fidalgo que o protegia, se propunham limpar a ofensa através do combate, com ou sem consequência eliminatória. Por não saber como manejar um florete, como consagrar as elegantes formas de esgrimir, não haveria resposta positiva a qualquer desafio que se fizesse e, por isso, bastaram umas figurativas bofetadas, em rede social, perante dois palmos de testa.

Opinião de:

Desafio para um duelo

Ele, João Marques de Almeida, não menos atravessado quando o assemelhamos no pensar a Steve Bannon, mesmo que mais viajado, fruto dos saldos da Easyjet, mas não inferior trauliteiro resultado de leitura pouca, usou a sua pena, a pedido do Observador do dia 30 de abril, para debitar fel, na sua relação patológica com António Costa, usando a personagem inenarrável que hoje preside aos destinos norte-americanos. Já não é a primeira vez que o faz, demonstrando cabeçada antiga.

Almeida compara Costa a Trump no que diz respeito à legitimidade da sua ascensão ao poder. Recalcitrado pelo facto de termos uma democracia a funcionar, quer o amanuense desmotivar a legitimidade de Costa perante uma eleição parlamentar que dita a governação. E dá mais um passo ao comparar as atitudes instigantes, racistas e xenófobas de Trump, quanto à representação dos marginalizados, com as posições de Costa sobre a assunção plena da democracia pluralista que em Portugal também se materializou a partir do final de 2015. 

Indo ao baú da perversão, Almeida consagra que Trump e Costa são “políticos moderados”. Onde quer chegar o inefável e vicioso ultramontano? Tão só ao ponto de, usando os 40 anos de existência política de Costa, sempre estando na vida pública em sufrágio permanente de ideias e comportamentos, poder fazer uma limpeza de imagem ao indizível Donald, o advindo senhor do imobiliário insuprível de New York. 

Mas a camada do bolo, ou parte do texto de Almeida, que serviria de toucinho do céu, é primorosa. Diz ele que a geringonça é mais radical que maioria republicana do Congresso. Não sei se Almeida se terá embeiçado por Sarah Louise Palin, ou se é um ilustre seguidor de Jeff Sessions, mas em Portugal, por muito que pesquise, não encontrará um qualquer político que seja 1/10 do radicalismo dos indicados. Geringonça e fanatismo republicano não conjugam na realidade e só pululam na demência de um saltitão.

Almeida diz que Trump e Costa lidam mal com as oposições e com qualquer tipo de independência das instituições. Fala mesmo de uma hipotética contenda com o Tribunal Constitucional, como que a fazer esquecer o que aconteceu entre 2011 e 2015.  Talvez não tenha memoração, ou talvez tenha usado de reserva, mas Costa, enquanto ministro da Justiça, enfrentou o chefe do executivo na salvaguarda da autonomia dos tribunais. Mas há ainda uma diferença, Costa é filho de gente livre e que lutou pela liberdade; Trump é filho da especulação, da ausência de perceção do valor facial dessa mesma liberdade.  Afirmar que “Costa e Trump exercem o poder com pouco respeito pelo princípio da separação de poderes” é mesmo insânia diagnosticada. 

Ao copista sem decoro ainda restou tinta para consagrar que Trump e Costa não “têm um pingo de vergonha e são de um descaramento sem limites”.  Conhecerá Almeida o seu mais próximo Trump e nós conhecemos Costa. E comparar as duas personalidades é mesmo uma instigação inaceitável. Almeida, ele sim, é mesmo um desenvergonhado. Mais, diremos que é mesmo um insolente direitolas. Nem o florete o salvaria de uma humilhante desonra pública. 

Apostilhas: 

1. O jornalista Rui Pedro Antunes ouviu Almeida sobre a matéria e o mesmo fez connosco. Na resposta, o cronista outorga-nos frases lapidares. 

Concede que estamos em patamares muito diferentes porque nós seriamos um político e ele um analista. Para Almeida a política é um redutor de bilha de gás. Deslembra os conceitos de política em Kant, Weber, Espinosa ou mesmo Maquiavel, gente pouco ilustre que beneficia unicamente as lombadas dos seus book’s presença de bibelot.   

Mas Almeida, essa luminária intelectual da Brandoa, faz mais. Esquecendo que as interpretações literais se abandonam a partir do segundo ciclo do ensino básico, concede que “até achava graça que ele (nós) me tentasse dar um par de bofetadas. Até porque levava de volta”. Magnifico este espírito rapazola do agente. Valentim Loureiro não faria melhor. Só que Valentim não se arma ao pingarelho asseverando-se como intelectual de pacotilha. 

2. O Observador deu-nos uma informação muito relevante. Almeida trabalhará na consultora Holdingham Group. Fomos validar quem é esta entidade, ou estas entidades em rede, e a conclusão é só uma – lobistas internacionais. Saberemos perante quem estamos quando lemos o Observador?