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Opinião: Contra a arrogância economicista

Opinião: Contra a arrogância economicista

Os efeitos da conjugação da globalização económica com a desregulação financeira internacional ativamente promovida por Washington e adotada como ortodoxia pelas instituições da União Europeia provocaram a desqualificação da vontade democrática e a degradação da soberania interna dos estados, conduzindo à crescente subordinação do mundo da política aos interesses e à lógica da ciência económica. Não sou economista e, por uma questão de princípio, não me permito opinar sobre matérias que desconheço ou de que não tenho conhecimentos suficientes para analisar dados, questionar metodologias, avaliar a pertinência dos respetivos postulados e extrair conclusões supostamente científicas.

Seria lógico esperar igual prudência e sobriedade da parte dos economistas que se pronunciam sobre questões que não dominam suficientemente ou que conhecem apenas na perspetiva estrita do saber económico. Contudo, este padrão de elementar seriedade académica não é confirmado pelo exuberante entusiasmo com que um significativo setor de comentadores de assuntos económicos se atirou aos índices do modesto desempenho da economia portuguesa agora divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística. Um entusiasmo que se revela em estranha sintonia com o mote escolhido para a Festa do Pontal que marcou, neste fim de semana, o regresso de férias do principal partido da oposição, responsável pelo Governo anterior.

O mote é este: a produção de riqueza, em Portugal, está a crescer muito lentamente e, pior ainda, a um ritmo que esmorece, continuadamente, desde março do ano passado! Em março de 2015, convém recordar, o chefe do Governo que iria perder as eleições em outubro anunciara o fim da austeridade e invocava esses frágeis indícios de aceleração económica como prova da inversão do ciclo de degradação da situação económica do país e a demonstração do sucesso das suas políticas de austeridade, duramente aplicadas ao longo de uma legislatura inteira. É bom de ver que nenhuma correlação pode ser estabelecida entre o pretenso sucesso das políticas de austeridade aplicadas ao longo de uma legislatura inteira e os índices económicos relativos ao primeiro semestre de uma governação que se propôs exatamente demonstrar a viabilidade de uma alternativa às opções políticas que o Governo anterior executou. Infelizmente, logo em agosto do mesmo ano, os dados publicados pelo INE desmentiam o triunfo reclamado por Passos Coelho, mas nem por isso arrefeceram a sua euforia eleitoral que se prolongou até à tomada de posse do novo Governo.

Noutras longitudes e com propósitos muitos diversos – comentando o programa de Hilary Clinton para as eleições presidenciais americanas – Paul Krugman, no “New York Times” de terça-feira, entrega-se a uma reflexão que devia merecer a melhor atenção dos nossos comentadores domésticos de economia! Interrogando-se acerca do que sabemos sobre os ciclos de crescimento económico, constata, conforme os dados oficiais, que não existem variações significativas no ciclo de crescimento estável que começou com Ronald Reagan e terminou com Bill Clinton, nem no ciclo de desaceleração do crescimento que foi inaugurado por George W. Bush e que se mantém até ao final do mandato de Barack Obama. E conclui o óbvio: “Esta história sugere que não há atalhos para mudar as tendências”.

Mas Paul Krugman vai mais longe nas suas conclusões e afirma: “Quando os conservadores prometem taxas fantásticas de crescimento económico, como na era de George W. Bush, o que pretendem é esconder quantos programas sociais vão suprimir para pagar as reduções de impostos”. E quando desprezam as questões da igualdade e da distribuição da riqueza em nome do crescimento económico, “o que pretendem realmente é evitar as questões políticas que efetivamente nos dividem”. E digo eu, resignado à minha manifesta iliteracia económica: à economia o que é da economia e à política o que é da política.

(in Jornal de Notícias)