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Opinião: A Direita e o cheiro a napalm

(Artigo de opinião de Ana Catarina Mendes no Jornal de Notícias)

“A decisão final da Comissão Europeia sobre a possibilidade da aplicação de sanções a Portugal, que constitui uma indiscutível vitória do país e da convicção e firmeza com que o Governo português conduziu todo o processo, revela, acima de tudo, sensibilidade e bom senso. E, não há como negá-lo, é também uma derrota fragorosa de todos aqueles – políticos e comentadores (ou até os que, mais ou menos discretamente, acumulam as duas condições…) – que, ao longo dos últimos tempos, reduzem a sua atividade ao anúncio diário de sucessivos apocalipses que se abaterão sobre as nossas cabeças. Nessa matéria, não pode deixar de ser destacado o líder do maior partido da oposição, cujas últimas intervenções antes da decisão de Bruxelas revelaram um oportunismo incapaz de colocar os interesses nacionais acima dos seus próprios interesses partidários.

A decisão da Comissão constitui uma tripla derrota de Passos Coelho:

  1. Afinal, a defesa dos interesses de Portugal feita pelo Governo não foi incompetente;
  2. Afinal, aquilo que ele designava como “desconfiança” da UE no Governo português não conduziu à aplicação de sanções;
  3. Afinal, ficou demonstrado à evidência que a subserviência, que ele tanto praticou e ainda cultiva, não é a melhor forma de defender Portugal na Europa.

A sensibilidade e o bom senso prevaleceram na Comissão Europeia, mas continuam a escassear no PSD de Passos Coelho. Mas não tenhamos ilusões: o tremendismo que tem sido a imagem de marca da Direita portuguesa desde a sua passagem à oposição, com reflexo mediático colossal, não terminará com mais este apocalipse desmentido. Ainda a decisão do colégio de comissários europeus estava “quente” e já os novos arautos do apocalipse previam mais uma descida do Diabo à terra portuguesa sobre a forma de “planos bês” austeritários, impostos a partir de Bruxelas. Sim, já soa a lengalenga, mas eles não desistem. Vejam bem: a CE exige que o défice de Portugal em 2016 seja de 2,5! O facto de a estimativa do Governo português ser de 2,3 (ou seja, abaixo da exigência europeia!) é irrelevante para os profetas da Direita lusitana, cegos na sua deriva ideológica e na sua sanha anti-“gerigonça”.

A Direita parece alimentar-se da intranquilidade permanente (evocando aquela personagem de Robert Duvall – Tenente Kilgore – no “Apocalypse Now”, de Francis Ford Coppola, que adorava o cheiro a napalm pela manhã). Foi assim no Governo, mantém-se assim na oposição. Fazem-lhe mesmo falta sensibilidade e bom senso.”